Choque de civilizações
A única ligação entre São Paulo e o Rio de Janeiro é a Dutra. Fora isso, tudo nos afasta: o clima, a geografia, os costumes e, claro, o idioma -- ou você vai me dizer que João Gordo e Evandro Mesquita falam a mesma língua?
Esta barreira idiomática, acredito, é a principal fonte dos nossos problemas: ninguém se entende, acaba surgindo uma certa animosidade, a gente acha que foi chamado de estressado, eles pensam que ouviram alguma coisa sobre malandragem e, quando vamos ver, já era: nós ficamos sem praia e eles sem pizza. Perda total.
O choque de civilizações, no entanto, está com os dias contados. Tendo em vista a amizade entre os povos, a paz mundial e os bolinhos de bacalhau do Jobi, resolvi fazer alguma coisa. Mergulhei em intensos estudos carnavalescos, escaldantes pesquisas praianas – entre outras experiências extremamente arriscadas (para um paulista) -- e trouxe à luz, acredito, uma grande contribuição para o entendimento entre os dois estados: a Pequena gramática do carioquês moderno.
Nela, cheguei às três regras básicas da língua falada por aquele povo: a regra do R, a regra do S e a regra das vogais. As duas primeiras são de conhecimento geral: R no final da palavra ou no meio se fala arrastado (porrrrrrta, perrrrrrto), e o S transforma-se em X (mixxxxxto-quente, paxxxxta de dentexxxx). É na regra sobre as vogais, no entanto, que consiste a originalidade da minha descoberta e é ela que fará com que a minha gramática, assim como meu nome, ainda ressoem por aí muitos séculos depois que eu tiver ouvido repicar o último tamborim.
Enquanto em São Paulo somos alfabetizados com o A – E – I – O – U, as crianças do Rio de Janeiro aprendem A – Ea – Ia – Oa – Ua. Sim, há um A depois de cada vogal. Pegue qualquer palavra, como copo, pé e carro, por exemplo, e aplique a regra das vogais. Agora, fale em voz alta: coapoa, péa, carroa. Viu só? Aía, éa sóa voacêa pôarrrr A eam tuadoa, troacarrr S poarrr X e eaxxxticarrr o R quea fiaca óatiamoa.
O caminho inverso também funciona. Ao ouvir uma frase em carioquês, por exemplo: “Tua éa móa manéa, paualiaxxxxta oatarioa, voalta pra Móoaca”, transcreva-a, subtraia os As sobressalentes e você terá a sentença em paulistês.
Embora seja um grande avanço em face da estagnação em que estavam os estudos do carioquês por estas bandas, minha gramática ainda tem um enorme desafio a esclarecer: como é que o S vira R na palavra mearrrrmoa (mesmo)? E, mais ainda, por que é só nessa palavra? Tema apaixonante ao qual, prometo, retornarei em breve.
Esta barreira idiomática, acredito, é a principal fonte dos nossos problemas: ninguém se entende, acaba surgindo uma certa animosidade, a gente acha que foi chamado de estressado, eles pensam que ouviram alguma coisa sobre malandragem e, quando vamos ver, já era: nós ficamos sem praia e eles sem pizza. Perda total.
O choque de civilizações, no entanto, está com os dias contados. Tendo em vista a amizade entre os povos, a paz mundial e os bolinhos de bacalhau do Jobi, resolvi fazer alguma coisa. Mergulhei em intensos estudos carnavalescos, escaldantes pesquisas praianas – entre outras experiências extremamente arriscadas (para um paulista) -- e trouxe à luz, acredito, uma grande contribuição para o entendimento entre os dois estados: a Pequena gramática do carioquês moderno.
Nela, cheguei às três regras básicas da língua falada por aquele povo: a regra do R, a regra do S e a regra das vogais. As duas primeiras são de conhecimento geral: R no final da palavra ou no meio se fala arrastado (porrrrrrta, perrrrrrto), e o S transforma-se em X (mixxxxxto-quente, paxxxxta de dentexxxx). É na regra sobre as vogais, no entanto, que consiste a originalidade da minha descoberta e é ela que fará com que a minha gramática, assim como meu nome, ainda ressoem por aí muitos séculos depois que eu tiver ouvido repicar o último tamborim.
Enquanto em São Paulo somos alfabetizados com o A – E – I – O – U, as crianças do Rio de Janeiro aprendem A – Ea – Ia – Oa – Ua. Sim, há um A depois de cada vogal. Pegue qualquer palavra, como copo, pé e carro, por exemplo, e aplique a regra das vogais. Agora, fale em voz alta: coapoa, péa, carroa. Viu só? Aía, éa sóa voacêa pôarrrr A eam tuadoa, troacarrr S poarrr X e eaxxxticarrr o R quea fiaca óatiamoa.
O caminho inverso também funciona. Ao ouvir uma frase em carioquês, por exemplo: “Tua éa móa manéa, paualiaxxxxta oatarioa, voalta pra Móoaca”, transcreva-a, subtraia os As sobressalentes e você terá a sentença em paulistês.
Embora seja um grande avanço em face da estagnação em que estavam os estudos do carioquês por estas bandas, minha gramática ainda tem um enorme desafio a esclarecer: como é que o S vira R na palavra mearrrrmoa (mesmo)? E, mais ainda, por que é só nessa palavra? Tema apaixonante ao qual, prometo, retornarei em breve.
24 Comments:
hahahah adorei! Me lembrou a Taíxxxxx da novela!
precisa explorar o sotaque nordestino também, ainda mais com a abundância dele aqui em são paulo.
antonio, adoro seus textos acho que faz maravilhas com o cotidiano, mas essa piada do carioca é muito manjada, né amor? não gostei... mesmo assim continuo gostando da sua escrita, vc é ótimo.
Genial!!! vou mandar para todos os cariocas que eu conheço. Mas, como sou uma "garoata" de princípios, vou ter que dar os devidos créditos...
não me responsabilizo pelas consequencias!!
kkkkkkkkkkkkkkkkkk
AdooOOOro demais! Vc me garante boas risadas!
Eu sou uma carioca que não suporta o sotaque carioca. "Aloha? Queam falam?" Na verdade quem fala assim é quem quer parecer "legáou", ou seja, escravos da moda em geral...
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engraçado! eu notei isso também. Mas tem algo de mais engraçado ainda, fiquei feito tonta na tela do computador, lendo as palavras com o acréscimo do A no final. Esse texto faz isso com a gente!
Muito bom! Sou carioca em SP e confesso que prezo pela regra da vogal! :)
Antonio,
Sou estudante de Lingüística em campinas e, devo dizer, seu texto apresenta uma abordagem muito interessante sobre as variantes do nosso português.
Adorei, de verdade!
Gênio!
E os famigerados cUlégio e tUmate, como é q faz??? Ou faix?
Receio haver sido ignorada mais uma importante característica da fonética do carioquêxx:
nas palavras em que o I antecede o O, dobra-se o I. Exemplo: "Onde você mora?"
"Moro no Ri-io."
Assim como fi-io e ti-io.
Né não, manéa?
hahahaha
Abraços!
Ps: Conheci o blog hoje, adorei. Parabéns!
Mermão...
sabe que eu não acho que a gente fala esse A aí?
Pôa, aía: mea amarreia! Tuadoavêa! Maneaiaroa seua blogea, Prata, podixcrê!
Parabens Antonio...Seu blog é maravilhoso... Adorei sua escrita!
Adorei a citacao do Evandro Mesquita...
Passarei aqui sempre!
beijos
Jo
Cara, na boa, sou carioca e não falo assim( a maioria normal, não fala assim!). O carioca que fala desse jeito é pra aparecer mais carioca. E fazem isso principalmente com paulixtax! Pra parecer descolado, saca?!
MUITO BOM!
HAHAHAHAHAHAHAHA
Totalmente verdade esse A a mais.
Sou paulista e tive uma perrenga com um amigo carioca sobre isso que o Fabiano comentou. O ti-io, o Ri-io. Eu dizia isso, que eles duplicavam o i. Mas olha o que ele me respondeu:
Cansado de aplicar meu gênio em tarefas nobres, busquei recreio num site de charadas infantis. Lá encontrei - tão mais eloqüente por ser produto da intuição diretamente conseqüente de uma criança - a prova de que, no dialeto paulista, palavras como tio, rio, frio etc., são monossílabos que deveriam ser grafados assim: til, ril, fril, etc.
Onde está o tio da sua mãe?(Jean Victor de Oliveira Rodrigues, 10 anos, Bauru-SP)
RESPOSTA
Em cima do "a" (acento til)
Mesmo admitindo-se que poderia ocorrer a qualquer um condescender com a imperfeição sutil do resultado - a bem da verdade, uma sutileza; não vamos ser implicantes -, a montagem, em si, não ocorreria, ao menos intuitivamente, a um não-paulista.
sou carioca e adorei. so senti falta do marrr como na frase: vou pegar marr 2 copos (+ vou pegar mais 2 copos) :D
Monica
Conheci o blog hoje, e achei fantástico/fantáxxxtico. Parabéns! Ou parabénxxx! =0)
abs
Decio Caramigo Neto (paulixxxta)
Qualé?! Faltou citar o numeral "douze"...
O Alexandre Frota vai ficar boladão!
Pois é, o s dá origem ao r nas vezes em que o carioca se sente influenciado pelo espanhol (merrmo, marr doixx copoxx, ou então dez mil - derr mil). Agora, por que sentirá essa influência aqui e, em outra ocasião, não, é um mistério, sem dúvida.
E também considero a observação sobre a palavra "douze" fundamental, bem como "naixxcimento" - são marcas profundas do carioquês bem falado.
Sabe que eu tenho um único amigo paulista que acha bonito?
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